Saturday, November 30, 2024

"Fala-me de ti, Juvenal" - teatro radiofónico

Teatro radiofónico, de Serena Cacchioli: Juvenal, personagem principal de Eternidade encontra-se com uma investigadora de literatura neste ano de 2024, estabelecendo um diálogo a propósito das questões eternas que o romance levanta.

Com Ana Maia e André Gago, aqui.



Friday, November 29, 2024

correspondências

(Jaime Brasil a Ferreira de Castro, 1926) «Meu caro Ferreira de Castro: // A sua conferência é na quinta-feira, 25, não é verdade? Peço-lhe que me indique o tema, para a anunciar. / Escusado será dizer que é preciso um resumo até à quarta-feira 24, para eu fazer tirar cópias para os jornais. // Disponha do / seu camarada / mtº at.º / Jaime Brasil //  Lx.ª, 15/2/926.» Cartas a Ferreira de Castro (2006) 

(Ferreira de Castro a Roberto Nobre, 1922) .../... «P.S. Propositadamente deixo para o Post Scriptum o assunto do Lab.º Ainda não foi possível arrecadar-lhes aqueles míseros 50$00. Eu não me descuido. Não é por si: -- é por mim... Abraços do Frias. JMF» .../... Correspondência (1922-1969) (1994)

(Reinaldo Ferreira / Repórter X a Ferreira de Castro e Mário Domingues, 1925) .../... «Levo um saco de impressões. Na falta de tempo que sempre [?] tenho de sintetizar a correspondência. / Vou ao Porto, onde estarei uns dias e dou depois uma saltada a Lisboa para vos abraçar. Escrevam-me para Iberia Film -- Edifício do Banco do Minho Porto. / Saudades ao Cristiano, Bettencourt, Reis etc. / Vosso // Reinaldo Ferreira» 100 Cartas a Ferreira de Castro (1992)*

Wednesday, November 27, 2024

dos romances

«Forçado a deter-se, ele regava, à esquerda e à direita, rudes pedras, velhos castanheiros, velhos cunhais, mas fazia-o alegremente e com o visível modo de quem leva pressa. Em seguida, voltava a correr no faro do seu dono. Cada vez o sentia mais perto e cada vez era maior o seu alvoroço. Por fim, lobrigou-o.» A Lã e a Neve (1947)

«A luz, ao entrar, varreu os pontos brancos que o ralo projectava ali, uns pontos brancos, aglomerados no jeito das cavidades dos favos e que constituíam a única luminosidade existente lá dentro quando a porta se encontrava fechada. / Dois bancos laterais corriam dum extremo a outro, no interior da furgoneta. Um homem levantou-se e começou a avançar em direcção à porta.» A Experiência (1954)

«-- Em Espanha janta-se sempre tarde de mais -- disse Soriano, em tom conciliador, assim que a criada saiu, depois de ter servido o café. -- É um horário absurdo o nosso. Quando estive emigrado na França e na Bélgica, é que dei conta disso. Nós desalinhamos a digestão da Europa, pois no momento em que os espanhóis começam a encher o estômago, já os outros povos estão a esvaziar o deles...» A Curva da Estrada (1950) 



Capa da 1.ª edição: Jorge Barradas (1947)


Tuesday, November 26, 2024

outras palavras

«A diabrura que pratiquei, desvaneceu-se no esquecimento; mas lembro-me, sim, que minha mãe, saindo do quinteiro e agarrando-me por um braço, castigou-me. Passava na estrada, enxada ao ombro, um homem alto, bigodes retorcidos festonando as faces trigueiras. Deteve-se, sorriu e disse: / -- Assim é que é, senhora Mariquinhas! Nessa idade é que eles se ensinam. / Odiei aquele homem.» [Memórias] (1931)

«Na luta alcançativa destes três Deuses apareceram Grandes, que às vezes esquecemos a sua qualidade de micróbios, para admirarmos as suas audácias na conquista do Querer, do Desejar, do Possuir. Mas os minusculamente pequenos, insignificantes ensimesmados, na sua estupenda quantidade numérica chegam a ser incomensuravelmente maiores que os Grandes...» Mas... (1921)

Thursday, November 14, 2024

errâncias

«Não se cura de revelar o Mundo aos passageiros e sim de lhes permitir dizer aos amigos que eles deram a volta ao Mundo. Viagem de bom conforto, nas cidades visitadas esperam guias e automóveis, que levam os curiosos aos monumentos principais e, depois, os reconduzem a bordo, para que se lavem da poeira do Oriente, jantem bem e bailem até de madrugada, enquanto o talha-mar vai singrando em direitura a outro porto.» A Volta ao Mundo (1940-44)

«Não. Ia-se muito longe, devassavam-se os mais distantes recantos do planeta, mas a Andorra, que estava perto, manando, possivelmente, inéditas emoções, ninguém ia, ninguém pensava ir. Nasceu, assim, a minha curiosidade, que, a princípio, tentei saciar com papel impresso. Foi desejo quase inútil, pois da bibliografia andorrana, pequena como o país, dificilmente se encontrava em Portugal obra de jeito.» Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1937-38)

«Lembra, por este mérito, o bairro dos cruzados em Rodes e Fatehpur Sikri, que foi capital da Índia e também permanece intacta, rutilando, escarlate e fantástica, sobre o topo duma colina. / Logo que entramos em Santilhana a nossa época desaparece. Os séculos medievos -- o XI, o XII, o XIII, o XIV -- abrem-nos as suas grossas portas, nas ruas em declive, e, então, a própria cor do nosso tempo se modifica.» As Maravilhas Artísticas do Mundo (1959-1963)



Capa do n.º espécime (1959)
Jan van Eyck, O Homem do Turbante Vermelho


Tuesday, November 12, 2024

correspondências

(Reinaldo Ferreira/Repórter X a Ferreira de Castro e Mário Domingues) «Paris, 3-11-925 // Meus queridos Amigos: Eis-me de volta de uma grande viagem -- a mais interessante de todas as que realizei até hoje. Foi mais longa do que eu julgava -- mas, graças a Deus, não fui comido pelos antropófagos, como dizem que se espalha por Lisboa.» .../... 100 Cartas a Ferreira de Castro (1992)

(Ferreira de Castro a Roberto Nobre) .../... «Telefonei neste momento ao Assis, para saber se ele desejava transmitir-lhe qualquer coisa. Tinha ido almoçar. Paciência. Sei, porém, que brevemente ele lhe enviará ou as provas ou o original da novela. Sei, também, que ele, como eu, está-lhe grato por suas gentilezas. / Abrace, Rob.º Nobre, o seu amigo dedicado // JM Ferr de Castro // Lisboa 19/9/922» .../... Correspondência (1922-1969) (1994)

(Jaime Brasil a Ferreira de Castro) «Paris, 14/10 // Meu caro Castro. // Como vai isso? Bem? Não sei se já lhe escrevi ou não. Ando arrasado das viagens, hábitos alterados... o diabo. O M. Domingues já veio? / Estou na R. Richer, 26 Pension Home. Se for necessário qualquer coisa escreva até ao dia 20. Recomende-me à "Tertúlia". Abraça-o o am.º e camarada // Jaime». Jaime Brasil, Cartas a Ferreira de Castro (2006)

Monday, November 11, 2024

uma selecção nacional, por Ana Moreira

daqui

 

Discutível, como o são todas: falta ali muita gente, e alguns duvido que lá devessem estar.

Agustina Bessa Luís, Ana Luísa Amaral, Dulce Maria Cardoso, Eça de Queirós, Fernando Pessoa, Ferreira de Castro, Florbela Espanca, Hélia Correia, Herberto Helder, Joana Bértholo, José Cardoso Pires, José Saramago, Lídia Jorge, Luís de Camões, Luísa Costa Gomes, Maria Judite de Carvalho, Mário Cláudio, Natália Correia.

Friday, November 08, 2024

dos romances

«Os seus toscos sapatos de borracha, com o feitio exacto das peúgas, semienterravam-se no tijuco ribeirinho e mais facilmente as pernas se desprendiam de dentro deles, do que eles se libertavam dessa lama pegajosa, quase tão voraz como as areias movediças.» O Instinto Supremo (1968)

«O polícia, que vinha sentado junto do motorista, chupou, quatro vezes seguidas, a ponta mungida do cigarro, atirou-a fora -- e desceu. Sentindo os olhares despejados lá de cima, que davam maior vaidade aos seus gestos, ladeou a furgoneta e, atrás, abriu a porta, que era chapeada e sólida como a dum cofre.» A Experiência (1954)

«O edifício, velho e longo, muito longo e de um só piso, parecia querer mostrar que a sua missão, justamente por ser celeste, devia agarrar-se à terra, estender-se bem na terra, para extrair a alma dos homens que nela viviam.» A Missão (1954)



Capa da 1.ª edição, desenho de Artur Bual (1968)


Wednesday, November 06, 2024

outras palavras

«E o vale aumentou em extensão e profundidade. Parece que todo o mundo está aqui, na sombra imensa. Almas, desesperos, ambições, impotências -- e a trégua desta noite, em volta da lareira. Parece que não há mais nada. / Mas o vale chora, clama, geme sempre. Vu-vu-vuuu, a ventania fustiga o esqueleto das árvores, os pomares despidos de folhagem, os choupos esgrouviados,, os amieiros que debruam o Caima.» «O Natal em Ossela» (1932/1974), Os Fragmentos 

«A terra cadáver imenso de pré-histórico monstro é refocilada por legiões intermináveis de parasitas: -- todo o reino animal. Que, como os últimos brasidos deixa evolar sobre a própria lama do sugar, um clarão: -- Do Querer, do Desejar, do Possuir.» «Mas... a prisão é a coroação», Mas... (1921)

«É em 1902 que começo a povoar o museu da minha vida, a decorar a galeria das recordações. / Foi numa tarde de sol -- tarde de luz forte que eu vejo ainda -- que dei início à tarefa. Eu brincava na estrada amarela que corria ao longo da casa onde nasci.» [Memórias] (1931)



Jaime Brasil (dir.), Ferreira de Castro e a Sua Obra
(inclui as «Memórias»)
Capa de Roberto Nobre (1931)