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Tuesday, September 04, 2018

«Ferreira de Castro, agitador no Brasil» 1990 - (1, repostagem)

[Artigo publicado no semanário O Jornal, de Lisboa, em 2 de Novembro de 1990. Apesar de esquemático, e de o assunto já então haver sido aprofundado na tese de Bernard Emery, José Maria Ferreira de Castro et le Brésil (1981), que à época eu desconhecia, posto-o aqui pela curiosidade de se tratar do meu primeiro escrito sobre o romancista.]


O mais conhecido romance de Ferreira de Castro, publicado há 60 anos*  pela Livraria Civilização, do editor Américo Fraga Lamares, desencadeou uma grande polémica no Brasil em 1934 (1), quando ali foi editado.
Em 1930, Ferreira de Castro era um jornalista prestigiado, que presidiu aos destinos do Sindicato dos Profissionais da Imprensa de Lisboa (à sua direcção se deve um protesto contra a censura, em 1927, bem como a edição da colectânea Uma Hora de Jornalismo, no ano seguinte, que reuniu textos de grandes nomes da imprensa da época), e um literato conhecido nos meios intelectuais lisboetas, mas de modo algum um autor consagrado. (2)


* O artigo é de 1990.
(1) 1935, no texto.
(2) Enfim, hoje seria mais cuidadoso. Emigrantes, publicado em 1928, já concitara imensas atenções, tendo a primeira edição esgotado rapidamente. Nesta altura, preparava-se já a 3.ª edição.


Tuesday, March 27, 2018

castrianas: Humberto de Campos sobre A SELVA


«Os outros falaram da natureza, dos seus prodígios e mistérios; ele fala do animal temerário que pretende subjugá-la, e que, vencido na sua luta com a terra-virgem, rola, morto, mas de bruços, mordendo-a ainda, e abraçado com ela.» Correio da Manhã (Rio de Janeiro, 1930)

 

Thursday, September 03, 2015

F de «Família» (para um Dicionário de Ferreira de Castro)

1. família de origem. Primogénito de José Estáquio e Maria Rosa Soares de Castro. Órfão de pai (sobre quem nunca escreveu uma linha que se conheça) aos seis anos. Desse casamento resultaram quatro filhos, sendo o futuro escritor o mais velho. Após a viuvez, a mãe teve mais descendência, não tendo sido, por enquanto, apurada a sua paternidade. «Asfixia» é a palavra que Castro usa para caracterizar a vivência familiar que lhe coube, invocando-a, em consequência dos métodos repressivos da mãe, que o humilhavam, como uma das causas da sua partida para o Brasil. Referências muito breves a uma avó, entre outros. Após o regresso, a relação com a mãe caracteriza-se por uma preocupação com o seu bem-estar, embora com alguma distância.

2. famílias que constituiu. vive, em união de facto, com Diana de Liz, entre 1927 e 1930, data da morte desta, não havendo descendência. Casa--se, em 1938, em Paris, com Elena Muriel, jovem pintora espanhola, mãe da única filha de ambos, Elsa, sem descendência.

3. "família espiritual". O termo é seu, referindo-se à comunidade de escritores, num inquéiro sobre Direito de Autor.

(adenda) 4. a representação da família na obra ficcional.

(a desenvolver)

Saturday, March 07, 2015

Cartas Inéditas a Ferreira de Castro (4)

Lopes de Mendonça, o autor dos versos de A Portuguesa, além de erudito historiógrafo da náutica dos Descobrimentos era um exigentíssimo estilista. A sanção* de uma figura deste peso já histórico -- concorrera com Eça de Queirós a um mesmo concurso promovido pela Real Academia das Ciências, tendo o seu Duque de Viseu logrado alcançar o discutido favor do júri em detrimento de A Relíquia --, constituiria para o jovem literato que se fez a si próprio uma distinção de modo algum desprezável. Vinha já longe o tempo de algumas ousadias alardeadas pelo Mas... (1921)
(cont.)

* Mendonça escreve sobre A Selva, em 1930.

Cartas Inéditas a Ferreira de Castro, lida e anotadas por Ricardo António Alves, Vária Escrita #1, Sintra. Câmara Municipal, 1994.

Tuesday, January 28, 2014

castrianas - Teresa Leitão de Barros



Teresa Leitão de Barros (1898-1983), escritora e crítica literária do Notícias Ilustrado, quando se publicou A Selva (1930) escreveu, entre outras, duas coisas importantes, que o tempo, que é mauzinho, veio confirmar: a primeira é que, publicados os dois romances, este e Emigrantes, dois anos antes, Castro sobressaía como o grande romancista da sua geração: «Ferreira de Castro consagrou-se a si próprio, quando escreveu as mais admiráveis páginas dos seus últimos romances. Os seus personagens, que ficam bem de pé, bem erguidos perante a nossa mais incondicional admiração, esmagam e afugentam os fantoches de tanto romanceco que contribuiu para divinizar alguns autores de sorte. São colossos amesquinhando pigmeus.»

Na verdade, quem, de 1930, importa hoje? Só Castro e Aquilino, que era da geração anterior. Morto Raul Brandão, nesse preciso ano, Assis Esperança não resistiu ao tempo (pese embora o magnífico Servidão, de 1946). Da geração de Ferreira de Castro, Régio avançaria com o importante Jogo da Cabra Cega, em 1934, que então passou despercebido, como seria de esperar; Miguéis terá o modesto Páscoa Feliz em 1932, esperando ainda cerca duas décadas para voltar a publicar; Nemésio, com o modestíssimo Varanda de Pilatos (1927), só em 1944 virá com o assombroso Mau Tempo no Canal; João Gaspar Simões romancista menor, nem é deste campeonato (o interessante Elói, também de 1932, não ganha no confronto com a Cabra Cega regiana); e Francisco Costa e Tomás de Figueiredo só nos anos 40 começam a publicar romances. Para além do que pululava pelos jornais, no elogio mútuo ou interessado, só mesmo Aquilino e Castro hoje importam.
Acrescenta também Teresa Leitão de Barros no Notícias da Tarde, acertadamente, podemos dizê-lo agora, à distância de 83 anos: «Como obra literária integralmente bem realizada, "A Selva" pertencerá, um dia, à História onde se analisam os livros definitivos e grandes que neste século foram escritos em língua portuguesa.»
"Neste século", atrevia-se a crítica, ainda em 1930. Olhando para trás, verificamos que acertou na mouche, mesmo com todos os grandes textos romanescos, e foram felizmente alguns, que se imprimiram até ao ano 2000...
Teresa Leitão de Barros, «Um grande livro do século XX», apud Jaime Brasil, Ferreira de Castro e a Sua Obra, Porto, Livraria Civilização, 1931.

foto: Maria Antónia Fiadeiro (org.), Mulheres Século XX -- 101 Livros, Lisboa, Câmara Municipal [2001]

Saturday, November 17, 2012

incidentais #9 -- demasiado bom para ficar esquecido

Do «Pórtico» original de A Selva, datado de Fevereiro de 1930

*Parto-o em três: o primeiro fragmento será a reflexão sobre o efeito que a vivência na Amazónia (1911-1914) teve em si, fazendo jus a todo o romance.

*«É bem certo que conduzimos ao longo da vida muitos cadáveres de nós próprios.» -- assim se inicia este preâmbulo, remetendo ora para o pavor da criança afastada da aldeia natal e desterrada naquela brenha, ora para os traumas persistentes no agora escritor, que ali chegou menino e se fez homem antes de a idade e os documentos lhe certificarem a adultez: «A minha vida tem andado cheia dêste pesadelo. Esqueço-me de mim, mas não me esqueço da selva. Dominou-me com o seu mistério e com a sua soberania; não a evoco sem um estremecimento de pavor. Cá a tenho, cá a tenho a romper o optimismo com que procuro cobrir, para menor sofrimento, o pessimismo e a morbidez que ela me deu.»

*Uma explicação possível para a eliminação deste trecho, demasiado bom para ser esquecido: a vontade de afastar o mais possível uma conotação autobiográfica.

*Elejo um segundo fragmento, que grosso modo persiste até hoje: «Eu devia êste livro a essa Amazonia longínqua e enigmática [...]», evocando em seguida os «anónimos» cearenses e maranhenses, os retirantes nordestinos que saíam em desespero da sua terra pobre e parca para um território desumano e desmesurado.

*Um último trecho, também retirado posteriormente: uma parte é transferida para o prefácio da 4.ª edição de Emigrantes; a outra alude à polémica que este romance já suscitara nos meios nativistas brasileiros. Castro espera que o mal-entendido se houvesse desvanecido: «As gentes do Ceará e do Maranhão, que trocam a sua terra pela Amazonia, não são menos desgraçadas que os nossos camponeses, que trocam Portugal pelo Brasil.»

* Enganara-se: A Selva suscitaria ainda mais a fúria dos nacionalistas de vistas estreitas e prosápia incontinente, dos verde-amarelistas cretinos, como, na ocasião, os qualificou José Lins do Rego.

Thursday, October 11, 2012

castrianas - "El horror es civilizado, y la belleza, natural.": «A Selva», segundo R. Cansinos Assens

«Esqueço-me de mim, mas não me esqueço da selva», escreveu Ferreira de Castro na 1.ª edição do seu romance, frase que  o escritor, crítico e erudito espanhol Rafael Cansinos Assens -- que Jorge Luis Borges considerou seu mestre -- destacou em La Libertad, de Madrid (1930), para salientar como a floresta amazónica, na qual Castro mergulhara com 11 anos, se constituíra como parte integrante da sua personalidade.
Entre outros aspectos, analisa o gesto apocalíptico e final do negro Tiago (que o articulista compara ao Macambira de O Rei Negro, de Coelho Neto (1914): para Cansinos, o antigo escravo configura uma némesis, instrumento de vingança com intuito justiceiro: «Su reacción vindicativa los comprende a todos en su agresividad; es personal y solitaria, aunque asuma incidentalmente un sentido social y pueda parecer el desquite que por su mano se toma sobre el común expoliador esa casta inmensa de explotados que abarca hombres de todas razas y colores.»
Tiago está, portanto, distante de Alberto, cuja tomada de consciência da desumanidade, da iniquidade com que são tratados os seringueiros, leva a uma alteração de ponto de vista ideológico, em que a sociedade deixa de se justificar na sua arrumação classista e hierárquica, inconsistente com a dignidade intrínseca de cada homem e de todos os homens. El horror es civilizado, y la belleza, natural. -- foi a forma lapidar como Rafael Cansino Assens se referiu à monstruosidade concentracionária dos seringais.
No "Paraíso" (a ironia...) que Ferreira de Castro nos retrata, e em todos os outros, os homens não estão só manietados pelas dívidas contraídas, como se reduzem eles próprios à desumanização quando, pela quase inexistência de mulheres, se permitem violar uma criança, ou, animalizando-se recorrem a práticas de zoofilia. Os castigos corporais infligidos aos seringueiros fugitivos (sem haverem liquidado a dívida que tinham para com o dono do seringal), capturados pelos sicários de Juca Tristão, desencadeiam o gesto de Tiago -- a eliminação do opressor pelo fogo. Recurso que R. Cansinos Assens vê não apenas como um desenlace lógico da narrativa, como uma própria exigência estética dela: «Etica y Estética van más unidas de lo que se cree.»
Castro tinha uma relação próxima com muitos escritores espanhóis, em especial na década de 1920 (um aspecto por historiar). Com Cansinos ela foi intensa do ponto de vista espistolar, enviando-se mutuamente os livros, mais espaçada no pós-guerra (os espólios de um e de outro poderão testemunhá-lo com maior precisão). A forma como o escritor espanhol, inicia esta importante crítica no jornal madrileno* denota uma proximidade mais além da simples relação literária e epistolar: «Mientras Ferreira de Castro pasea por las Azores su neurosis litteraria y el pabéllon de «O Século», el gran periódico que le tiene por su insustituible cronista, nos llega de Oporto esta novela suya, «A Selva», que se inscribe en el ciclo iniciado por «Emigrantes» y que puede considerar-se auspiciado por una alta intención social.»

* coligida por Jaime Brasil, Ferreira de Castro e a Sua Obra, Porto, Livraria Civilização, 1931.

Monday, October 08, 2012

Castrianas - Mário Gonçalves Viana

Crítico literário do Jornal do Comércio e Colónias e polígrafo, Mário Gonçalves Viana (1900-1977) foi um dos primeiros a notar o estilo poético de Ferreira de Castro, na recensão a A Selva, acabado de sair («o maior acontecimento literário da presente temporada», dirá), classificando o romance como um «autêntico poema em prosa». 
Lendo bem o livro, não esquecerá a questão social, protagonizada pelos seringueiros, chamando contudo a atenção para o papel central da floresta na narrativa:

«[...] àparte a evocação admirável da escravidão do homem pelo homem, o enredo é quase um pormenor, um pretexto ou mesmo um incidente. o que avulta, o que emplga, o que deslumbra -- é a descrição do cenário estupendo dentro do qual o romance gravita [...].»
Mário Gonçalves Viana, «"A Selva", uma obra-prima», Ferreira de Castro e a Sua Obra, Porto, Livraria Civilização, 1931.

Wednesday, May 30, 2012

Ferreira de Castro e Reinaldo Ferreira -- Nota sobre a viagem do Repórter X à Rússia (3)

Reinaldo Ferreira e Ferreira de Castro. Não houve jornalistas mais amigos e mais diferentes -- nos temperamentos e nos processos. Ao sensacionalismo quase doentio perseguido por Reinaldo, Castro contrapunha uma seriedade na escolha e no tratamento dos temas, que, contudo, não deixavam de ter impacte. Enquanto que o X se disfarçava de mendigo ou pasmava Lisboa e o país com a investigação do assassínio da actriz Maria Alves -- temas que por vezes lhe serviam para novelas, peças de teatro e até filmes --, Castro preocupava-se com a situação dos presos no Limoeiro (2), dos vagabundos nos albergues nocturnos (3), as condições de trabalho nas Minas de S. Domingos (4), entrevistava o chefe republicano irlandês Eamon de Valera (1886-1975) (5), dava a conhecer aspectos da sociedade e da cultura corsas (6).

(2) Ferreira de Castro, «O segrêdo das nossas derrotas. Como eu fui preso... no Limoeiro», Uma Hora de Jornalismo, Lisboa, Caixa de Previdência do Sindicato dos Profissionais da imprensa de Lisboa, 1928, pp. 85-92 -- «Além do jornalista havia em mim o curioso; eu amo tanto a liberdade, que desejava averiguar como podiam viver aqueles que a não tinham» (p. 88).

(3) Ferreira de Castro, «A noite dos miseráveis -- Como se dorme num albergue nocturno», in António Valdemar e Jacinto Baptista, Repórteres e Reportagens de Primeira Página, vol. II, Lisboa, Conselho de Imprensa, 1992, pp. 276-278.


(4) Censurada na época, a reportagem seria alçada à categoria de evocação literária, ficando para a posteridade como um dos texto mais notáveis de Ferreira de Castro: «Historial da velha mina», Os Fragmentos, 2.ª edição, Lisboa, Guimarães & C.ª [1974], pp. 17-41.


(5) O Museu Ferreira de Castro exibe um autógrafo, em gaélico, de de Valera, que o escritor entrevistou para O Século, peça publicada na edição de 22 de Novembro de 1930: Por intermédio do "Século", saúdo afectuosamente o povo de Portugal, velho amigo da Irlanda». «Dev», abundantemente citado no capítulo sobre a Irlanda, em Pequenos Mundos e Velhas Civilizações, o mais marcante político irlandês deste século, fundador do IRA, foi opositor ao tratado com a Inglaterra que deixou sob a coroa britânica os seis condados que formam o Ulster. Quando Castro se encontrou com ele -- entrevista de que resultou um impressivo retrato dum homem determinado e absolutamente seguro da sua causa --, estava na oposição, após ter liderado uma das facções da guerra civil de 1922-23. Formaria governo pela primeira vez em 1932, chefiando o executivo em várias ocasiões. Foi eleito presidente da República da Irlanda por duas vezes, entre 1959 e 1973. Segundo Ferreira de Castro, o estadista era «um dos descendentes de Juan de Valera -- o célebre escritor e diplomata espanhol do século passado.» (Ferreira de Castro, Pequenos mundos e Velhas Civilizações, 5.ª edição, vol. II, Guimarães & C.ª, 1955, p. 257). desconhece-se qual a fonte do escritor. Juan de Valera y Alacalá Galiano (1825-1905) -- que se correspondeu com Oliveira martins (1845-1894) --, poeta, historiador e diplomata, ministro da Espanha em Lisboa entre 1881-83, seria o avô paterno de Eamon. os biógrafos oficiais deste referem-se de passagem ao avô como tendo estado envolvido nas negociações sobre o comércio de açúcar entre a Espanha e os Estados Unidos, que envolviam Cuba. Em 1886, ano do nascimento de «Dev», nos Estados Unidos, Juan de Valera representava o seu país em Washington. Ver Tim Pat Coogan, De Valera -- Long Fellow, Long Shadow, London, Arrow Books, 1995, pp. 6-7. 


(6) Ver capítulo dedicado à ilha em Pequenos Mundos e o opúsculo Canções da Córsega [1936], 2.ª ed., Sintra, Câmara municipal / Museu Ferreira de Castro, 1994.


Vária escrita #5, Sintra, Câmara Municipal, 1998, pp. 257-268.
  imagem

Monday, March 12, 2012

As "Notas Biográficas e Bibliográficas" de Jaime Brasil (1931) (2)

Terminadas em Outubro de 1930, meses após a morte de Diana de Lis e durante o internamento de Ferreira de Castro, acometido de septicemia, tenho para mim (e já o escrevi) que estas notas de Jaime Brasil sobre a vida do autor do recém-publicado A Selva – abertura do volume colectivo Ferreira de Castro e a Sua Obra (1931) – se destinaram a um in memoriam, que, felizmente para o jovem escritor e para o romance português, não veio a concretizar-se sob esse pretexto, e a ter razão de ser senão quarenta e três anos mais tarde. Como se sabe, Castro esteve às portas da morte e chegou a ser redigido o necrológio para os jornais -- não falando da tentativa de suicídio que, só em 1994, eu teria ocasião de revelar, em apêndice à sua correspondência com Roberto Nobre – embora o tópico suicidário houvesse sido aflorado pelo próprio, precisamente nas «memórias» de infância que Ferreira de Castro e a Sua Obra encerra.

Wednesday, December 29, 2010

«A cruel indiferença do universo»: Raul Brandão e Ferreira de Castro (3)

Referindo-se ao que de específico existe na sua obra, à Dor e ao Sonho, à Verdade e à Descrença (assim mesmo, com maiúsculas, ibidem, p. 38), o novíssimo escritor referenciava os espectros que a povoam:

«Raul Brandão não criou personagens. Pegou na Desgraça, na Dor, no Ódio, na Cobiça, na Perversidade e pregou-lhes uma pernas cambaias. E abriu-lhes um boca disforme. » (ibid., p. 36).

Declarando não conhecer Raul Brandão, desejando mesmo não o conhecer para não se desiludir com uma mais que previsível fragilidade humana pudesse «manchar a transcendência de Raul Brandão pensador» (ibid., pp. 37-38), o texto em apreço -- aliás, previamente publicado na efémera revista A Hora (1) -- estaria na origem de uma amizade só interrompida em 1930, com a morte do criador da Candidinha: «ficara Raul Brandão meu amigo», recordará Castro décadas mais tarde, evocando este primeiro escrito. (2). Após ter lido o artigo, Brandão escreveria ao seu autor:

«São raras efectivamente as pessoas que em Portugal estimam os meus livros, mas essas bastam-me quando compreendem não o que vale a minha obra necessariamente imperfeita, mas o esforço que faço, para arrancar alguns farrapos ao limbo...» (3)

(1) No número 3, em 26 de Março de 1922: «Os grandes peninsulares -- Raul Brandão». Muitos dos textos do Mas... saíram previamente n'A Hora. Por outro lado, apesar de o livro ostentar a data de 1921 no frontispício, viria apenas a publicar-se no ano seguinte, uma vez que Castro foi pagando a sua impressão à medida das disponibilidades financeiras.
(2) Ferreira de Castro, «[Raul Brandão]», A Unidade Fragmentada. Dispersos de Ferreira de Castro, antologia e apresentação de Ricardo António Alves, Sintra, Câmara Municipal, 1996, p. 235. Texto originalmente publicado em Raul Brandão -- Homenagem no Seu Centenário, Guimarães, Círculo de Arte e Recreio, 1967, pp. 52-54.
(3) Nespereira, 28 de Março de 1922. In Ricardo António Alves (ed.), 100 cartas a Ferreira de Castro, Sintra, Câmara Municipal, / Museu Ferreira de Castro, 1992, p. 9. (Cota do documento: MFC/B-1/13904/Cx.297/Doc.1).

Friday, August 11, 2006

Uma epígrafe de «A Selva» (Tavares Bastos)

A sensação de profunda melancolia que se apodera do espírito, nos adverte de que estamos dentro das mais densas solidões do Mundo. No Alto Amazonas, principalmente, domina esse amargo sentimento que obriga a alma a dobrar-se sobre si mesma.

Vale do Amazonas

Sunday, April 30, 2006

Ir estando

Um blogue para ir estando com o autor de A Selva.