Sunday, July 26, 2009

Outras palavras - A DIANA DE LIZ (1932)

Está aqui, amor, a tua novela. Durante quase dois anos fugi, covarde, perante uma dor maior, de seleccionar os teus papéis, os papéis que as tuas mãos e os teus olhos acariciaram e que foram do muito pouco que pedi para se salvar do naufrágio da nossa vida. Mas, há meses, numa lívida antemanhã de hospital, arrependi-me de não ter enfrentado a nova dor, lacerando mais uma vez o pobre coração. A morte, que, desde há dias, estava estendida ao meu lado, parecia-me, finalmente, resolvida a levar-me também. Eu, de certa maneira, não a temia; desde que ela te arrebatou ao meu carinho, que importava que me cerrasse também a mim, e para sempre, os olhos?
In Diana de Liz, Memórias duma Mulher da Época, Lisboa, Guimarães & C.ª - Editores [1932], p. 5.

Saturday, July 25, 2009

História e memória: uma leitura de Os Fragmentos (2)

A desatenção que o público manifestou e continua a manifestar para com este último conjunto de textos de Ferreira de Castro -- embora compreensível porque o livro se publicou nesse ano de exaltações e outras urgências do 25 de Abril -- não deixa de ser lastimável, pois estamos perante um legado testemunhal de inequívoca importância e valor de alguém que atravessou grande parte do século XX e marcou duma forma indelével a literatura portuguesa do seu tempo.
Língua e Cultura, n.º 7 e 8, Lisboa, Sociedade da Língua Portuguesa, Janeiro / Junho de 1998, p. 137.

Tuesday, July 21, 2009

Gloria In Excelsis -- Histórias Portuguesas de Natal

Gloria In Excelsis -- Histórias Portuguesas de Natal, apresentação e selecção de Vasco Graça Moura, Lisboa, Público - Colecção Mil Folhas, Dezembro de 2003.

Textos: Andrade Ferreira, Ramalho Ortigão, Eça de Queirós, D. João da Câmara, Abel Botelho, Fialho de Almeida, Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, Ferreira de Castro [«O Natal em Ossela», pp. 143-146], Vitorino Nemésio, José Régio, José Rodrigues Miguéis, Domingos Monteiro, Miguel Torga, Manuel da Fonseca, Jorge de Sena, Maria Judite de Carvalho, Natália Nunes, José Saramago, Urbano tavares Rodrigues, Alexandre O'Neill, Altino do Tojal e José Eduardo Agualusa.

Saturday, July 18, 2009

outras palavras - Jaime Brasil, CARTA PARTICULAR (1950)

De Jaime Brasil, jornalista profissional,
ao autor das "Orelhas compridas", literato amador

Muita saúde!

Recebi, há meses, uma carta, assinada por uma tal Maria Agustina, a enviar-me um livro. Respondi-lhe. Voltou a escrever-me, dizendo alguns dislates. Retorqui no tom conveniente. Trocámos, assim, uma dezena de cartas. A resposta à minha última não veio pela via habitual da correspondência privada. Veio pela via pública.* Por isso, de mistura com a poeira do caminho, trazia alguns salpicos de lama.

* Bessa Luís, Os Super-Homens e "Os Orelhas Compridas" -- A Propósito do Diálogo Bessa Luís -- Jaime Brasil, Porto, edição da Autora, 1950. Brasil responde a este folheto, que terá réplica de Bessa Luís, Dissecação a um ex-Crítico de Arte, Porto, edição da Autora, 1950.

Carta Particular (com Vistas à Opinião Pública) Dirigida por Jaime Brasil ao Autor das "Orelhas Compridas", Porto, edição do Autor, 1950, p. 5.

Sunday, July 12, 2009

Literatura, Artes e Identidade Nacional -- Do Modernismo à Actualidade (2)

Como já tivemos oportunidade de escrever, um romance como Sinais de Fogo (1979) não foi, senão na sociedade livre em que se publicou. O que nos remete para a questão, por vezes irritantemente académica -- tal como o foi a do nosso feudalismo / senhorialismo, tal como o é a do nosso fascismo / autoritarismo --, que consiste no averiguar estatístico da existência, ou não, de obras-primas quedadas na gaveta, mercê de uma censura de meio-século. O crítico solerte, com argúcia de contabilista, deduzirá que muito poucos textos literários -- quase nenhuns --, vindos entretanto a lume, gozarão desse estatuto. Quando a interrogação deveria ser esta: quantos grandes romances, poemas, ensaios deixaram de ser escritos por causa da censura? (2) Houve, contudo, casos singulares, o mais notável dos quais terá sido o de Alexandre Pinheiro Torres, cuja integral produção romanesca até à data (cinco romances, entre A Nau de Quixibá, publicado em 1977, e A Quarta Invasão Francesa, de 1995) conheceu primeiras versões nos anos sessenta. (3)

(2) Ver uma aproximação a este assunto, conquanto focalizada essencialmente num autor: Ricardo António Alves, «Ferreira de Castro: Um escritor no país do medo», in Taíra, n.º 9, Crelit, Grenoble, Université Stendhal, 1997.
(3)Ver Eunice Cabral, «A gaveta prodigiosa», in JL-Jornal de Letras, Artes e Ideias, n.º 677, de 25 de Setembro de 1996, pp. 38-39.

Literatura, Artes e Identidade Nacional -- «Do Modernismo à Actualidade», separata das Actas dos 3.ºs Cursos Internacionais de Verão de Cascais - 1996, Cascais, Câmara Municipal, 1997, pp. 183-184.

(continua)

Saturday, July 11, 2009

testemunhos #5 - Jorge Amado

No Cais de Lisboa, em Janeiro de 1966, amigos brasileiros e portugueses acenavam para o navio espanhol onde havíamos embarcado na Bahia, Zélia, Paloma e eu -- João Jorge fora de avião. Reconheci Odylo Costa, filho, Luiz Henrique Dias Tavares, Álvaro Salema, Fernando Namora, Francisco Lyon de Castro -- o primeiro a subir a escada foi Ferreira de Castro, com a notícia de que poderíamos saltar em Lisboa, a interdição fora suspensa. O grande escritor português, naquele então o principal entre todos os que escrevíamos em língua portuguesa, não podia conter a alegria. Durante todos os longos anos de convivência, de amizade fraterna que nos ligou, Ferreira de Castro sempre foi o arauto de boas novas, mão solidária, palavra acolhedora.

«Notícia de Ferreira de Castro», Vária Escrita, n.º 3, Sintra, Câmara Muncipal, 1996, p. 15.

Monday, July 06, 2009

«A Selva» dos leitores

Na passada sexta-feira, dia 3, teve lugar no Museu Ferreira de Castro uma sessão do Clube de Leitura, com A Selva como livro do mês.
Anotei algumas impressões dos leitores:

1. "sintonia entre o drama das pessoas e o ambiente";
2. "reflexos da História de Portugal no percurso de Alberto";
3. "Ferreira de Castro não era um ingénuo político";
4. "romance difícil de classificar: romance de espaço, romance psicológico, romance de iniciação, romance autobiográfico";
5. "riqueza lexical";
6. "recurso a símbolos gráficos, modernismo";
7."Alberto era um progressista sem o saber";
8. "psicologismo com um cunho freudiano: a selva é um ser vivo; é a mulher";
9. " a selva humana está muito retratada";
10. "um livro de ética, um manual de humanização";
11. "um livro simples e transparente";
12. "influência do simbolismo".

Deixei-me ir na conversa, e não tomei mais notas. Foi pena.

o jovem Ferreira de Castro -- O DRAMA DA SOMBRA [1926]

Aquela mulher era ali, no Estoril elegante, a máxima fascinação, a serpente de olhos verdes de todos os veraneantes masculinos.
Ferreira de Castro, O Drama da Sombra, Lisboa, Empresa Diário de Notícias [1926], p. 5.

Saturday, July 04, 2009

Prémio Lemniscata

O blogue O Fio de Ariadne atribuiu o prémio Lemniscata ao blogue Ferreira de Castro “O selo deste prémio foi criado a pensar nos blogs que demonstram talento, seja nas artes, nas letras, nas ciências, na poesia ou em qualquer outra área e que, com isso, enriquecem a blogosfera e a vida dos seus leitores."Sobre o significado de LEMNISCATA: “curva geométrica com forma semelhante à de um 8; lugar geométrico dos pontos tais que o produto das distâncias a dois pontos fixos é constante.” Lemniscato: ornado de fitas; Do grego Lemniskos, do latim, Lemniscu: fita que pendia das coroas de louro destinadas aos vencedores (In Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora).Acrescento que o símbolo do infinito é um 8 deitado, em tudo semelhante a esta fita, que não tem interior nem exterior, tal como no anel de Möbius, que se percorre infinitamente.Texto da editora de “Pérola da cultura”.

Obrigado Ana Paula!

Thursday, July 02, 2009

Ferreira de Castro: um escritor no país do medo (2)

Exemplos

Sobre esta realidade escreveu Jorge de Sena (1919-1978), em 1960, autoexilado num Brasil ainda livre:
«Quem se debruçar sobre a literatura portuguesa -- e não só a ficção deste século -- não a entenderá, se não souber entender tal situação trágica. Felizes os grandes e livre povos! Mas será que, quando esses povos discreteiam do que é a literatura , saberão, como nós sabemos, a que ponto ela pode não ser? E sendo-o, pode não ser reconhecida(1)

(1) Jorge de Sena, «A literatura portuguesa de ficção», Estudos de Literatura Portuguesa, vol. III, Lisboa, Edições 70, 1988, p. 44.

Taíra -- Revue du Centre de recherche et d'études lusophones et intertropicales, n.º 9, Grenoble, Université Stendhal, 1997, pp. 65-66.