Sunday, July 09, 2006

Outras palavras #1 - A arte moderna ante a sociedade actual (1)

[fotografia de San-Payo]

O nosso colaborador e distinto escritor Ferreira de Castro realizou no passado Domingo, na Associação dos Empregados de Escritório, uma conferência subordinada ao tema «A arte moderna ante a sociedade actual».
É dessa conferência o excerto que se segue:
A Arte em todos os tempos teve a sua parte frívola e a sua parte profunda. Uma para a Eternidade, outra para o minuto que se esgota.
E a Arte Moderna possui também essa dupla face. Mas a frivolidade, o humorismo, a blague, constituindo uma corrente da Arte Moderna, não constituem a Arte Moderna em si. Se o riso é muitas vezes a mentira com que se dizem as grandes verdades, é também certo que não é de riso mas sim de profunda expectativa essa atitude de quem ausculta o coração do homem, o coração duma época, o coração do mundo.
E seria grotesco que para sondar a nossa época, tivéssemos de gargalhar ou de recorrer aos processos artísticos do Passado.
Só um espírito superficial pode confundir uma das muitas correntes da Arte Moderna com a orientação do conjunto.
Mas na realidade essa confusão dá-se no espírito da maioria.
Os amantes dos processos arcaicos -- chamemos-lhes misericordiosamente amantes -- nada definem do que seja moderno: englobam personalidades, correntes diversas, técnicas individuais, sob esta terrível legenda: Arte moderna, arte de Fantoches, arte execrável...
E já que não a podem compreender, procuram olvidá-la ou empenham-se em detractá-la.
Isto aconteceu com todas as renovações artísticas e sociológicas.
-- Loucos! Loucos! -- exclamam os velhos bonzos, desde a quietude de suas peanhas.
Mas o mundo segue a sua rota incognoscível e os loucos de ontem são os génios de hoje -- os precursores de sempre.
(continua)
A Batalha -- Suplemento Semanal Ilustrado, n.º 18,
Lisboa, 1 de Março de 1926, p. 6.

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