Wednesday, March 30, 2011

Ferreira de Castro, Raul Proença e o «Guia de Portugal» (3)

Em 1921, ano em que se inicia a publicação da revista [Seara Nova], a 1.ª República estava ferida de morte. O breve consulado de Sidónio Pais fora apenas um sério aviso em face da degradação a que a burguesia jacobina tinha submetido o país, com ondas de choque de sinais contrários -- do restauracionismo monárquico (1919) às brigadas turbulentas da «leva da morte» (1918) e da «noite sangrenta» (1921). Com o país no caos e a caminho do abismo, um grupo de escol lança um programa que designa como de «salvação», em cinco pontos:

1) «Renovar a mentalidade da elite portuguesa, tornando-a capaz dum verdadeiro movimento de salvação;»
2) «Criar uma opinião pública nacional que exija e apoie as reformas necessárias;»
3) «Defender os interesses supremos da nação, opondo-se ao espírito de rapina das oligarquias dominantes e ao egoísmo dos grupos classes e partidos;»
4) «Protestar contra todos os movimentos revolucionários, e todavia defender e definir a grande causa da verdadeira Revolução;»
5) Contribuir para formar, acima das Pátrias, a união de todas as Pátrias -- uma consciência internacional bastante forte para não permitir novas lutas fratricidas». (1) 

(1) In Sottomayor Cardia (edição), Seara Nova -- Antologia -- Pela Refroma da República (1) (1921-1926), Lisboa, Seara Nova, 1971, p. 89.

 Castriana #2, Ossela, Centro de Estudos Ferreira de Castro, 2004.

Sunday, March 27, 2011

mais uma beleza da T.

no Dias que Voam. Castro prepara-se para A Lã e a Neve (1947), uma da suas obras-primas. A notícia datará de 1945-46. Uma observação: em cima da estante vê-se um fauno em bronze, que lhe foi oferecido por Manuel Teixeira-Gomes, e uma cerâmica mais pequena representando Ganesh, o deus-elefante do hinduísmo, pelo qual o escritor tinha particular aversão, tal como no-lo relata em A Volta ao Mundo. Ambos podem ser vistos no Museu Ferreira de Castro.

Wednesday, March 16, 2011

Viajar com Ferreira de Castro (3)

Esta vontade inabalável que assiste todas as vocações permitiu ao jovem autor, no regresso ao país, singrar simultaneamente no jornalismo e na escrita, abandonando mais tarde a missão de publicista para se consagrar definitivamente à sua obra. O autodidactismo não foi obstáculo a que, até 1927, publicasse um número apreciável de títulos que virá, logo na década seguinte, a excluir da sua tábua bibliográfica e a impedir que fossem reeditados. Com injustiça para alguns deles, diga-se; porém, o percurso errático que caracteriza esse período, próprio de quem se procura como autor, foi determinante para essa decisão.

«Ferreira de Castro -- O triunfo de uma vocação», Viajar com... Ferreira de Castro, Porto, Edições Caixotim e Ministério da Cultura / Norte, s.d.

Thursday, March 03, 2011

Para além das ortodoxias: Ferreira de Castro e Francisco Costa (3)

Escrevendo sobre o último livro de Francisco Costa, José Carlos Seabra Pereira notou a persistência de um «franciscanismo» que se manifesta num intenso poema como «Cristo na rua» (5), já evidenciado naquele mesmo Verbo Austero, explicitamente em poemas como «Caridade», «O monge» ou o quinto poema de «Per crucem ad lucem» (6): «[...] Dei do meu pão; lavei mais duma chaga; / chorando, enxuguei lágrimas; e em paga / hei-de fitar o Sol, -- supremo gozo! [...]» (7) Ora o franciscanismo pressupõe uma atitude de opção pelos pobres e desprotegidos, de comunhão com o mundo dos homens que não era estranha a Ferreira de Castro, mesmo se por esse então a sua literatura participasse da euforia [a]pós-modernista dos anos vinte -- um modernismo então já com o postiço das lantejoulas à António Ferro, enquanto não chegava o assentamento presencista --, remetendo para um secundário plano temas pretensamente «vulgares». (8)

(5) Francisco Costa, Última Colheita, p. 49.
(6) José Carlos Seabra pereira, «A poesia na jornada de Francisco Costa», Colóquio / Letras #100, Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1987, pp. 139-141.
(7) Francisco Costa, Verbo Austero, p. 104.
(8) Na 1.ª edição de Emigrantes (Lisboa, livraria Renascença, 1928), castro refere-se ao motivo excepcional da obra, muito diferente do que se passava com os seus livros anteriores. 

Vária Escrita #10, t. II, Sintra, Câmara Municipal, 2010.